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quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Vida Selvagem Atrás das Grades

(Escutando: E.S Posthumus - Pompeii)

Certo tempo atrás estava eu trocando de canais na televisão e escutei um ambientalista começando uma frase, “O Zoológico do Rio de Janeiro conta com mais de quinhentos detentos...” Hoje me lembrei desse fato e fiquei pensando sobre isso. Por que chamar animais de detentos?
Em duas vezes que fui ao zoológico lembro de ter pensado, “O que esses animais devem pensar? A prisão deles é nossa diversão?” Eu vou explicar isso.
O Zoológico do Rio de Janeiro é enorme e embora tenha espaço para se colocar vários outros animais e expandir um pouco as jaulas de alguns animais que parecem infelizes demais, não parece estar nos planos da Prefeitura. Deve ser por isso que senti tanta falta de ver Rinocerontes, Zebras, Pandas, Focas e Gorilas. Fico imaginando o por que do zoológico, que deveria proteger e tratar os animais fazendo com que eles fiquem o mais próximos possível de seu eco-sistema natural, investe em formas cada vez maiores de explorá-los. Parece muito mais fácil já que os animais de lá estão ainda estão relativamente longe da extinção.
Ver o Leão (Panthera Leo), Rei da Selva, impotente, com um olhar sem alma, trancafiado dentro de um ambiente com pouco mais de 10m2 não é algo que me faz sentir orgulho da sociedade em que vivo. A desgraça dos animais vira a diversão de outros animais que teimam em dizer que são conscientes, racionais, esclarecidos... seres-humanos. E muito embora parta do bom senso não agredir outras pessoas e menos ainda animais enjaulados, alguns ainda sentem a necessidade de jogar objetos contra eles. Talvez sejam as mesmas que ficaram tristes ao ver o noticiário sobre a morte do macaco Tião.
Testemunhei um grupo de crianças jogando pedras no Leão que devia pesar pelo menos uns 200kg e mesmo que aquilo obviamente estivesse incomodando-o, nada fez. Apenas continuou deitado, tentando dormir. Ver pais e mães rindo disso é ainda mais deplorável. Me pergunto que mal faria abrir as grades por alguns minutos até que toda a real “sujeira” fosse “lavada”.
O Chimpanzé (Pan Troglodytes), sentado como um malandro, encarando os visitantes como quem diz, “Estão olhando o que, trouxas?”, deixa claro o quanto esse animal é parecido conosco. O fato dele de vez em quando arremessar fezes na direção das pessoas não faz dele um “Filho da p...”, como várias pessoas exclamaram ao mesmo tempo ao ver bosta primata voando em sua direção. Isso faz dele um macaco. Um primata. Um ser que ficou para trás na evolução, mas não há como negar: nós somos parentes não tão distantes deles. Dito isso, por que um macaco, trancado em uma jaula com uma fêmea que nós, humanos, não nos perguntamos se é o par ideal para ele acasalar (você faria sexo com uma mulher feia só porque o trancaram junto dela num quarto?), sem contato nenhum com seu habitat natural é um “filho da p...”, e nós, raça mais evoluida do planeta Terra, donos das maiores construções, viajantes do espaço, desbravadores dos oceanos, não o somos ao jogar objetos nesses animais somente para que eles comecem a bater palmas ou a rugir? Acho estranho ninguém ter parado para pensar que esses animais não querem reproduzir, não querem brincar ou divertir os outros; eles querem é dar o fora dali!
O comediante Chris Rock em seu stand up “Never Scared”, disse uma das frases que talvez nunca mais saia da minha cabeça quando se referiu ao caso em que o mágico de Las Vegas, Roy Horn foi mordido por seu Tigre Branco, Monticore. “O tigre morde a cabeça do homem e todo mundo fica zangado com o tigre. Dizem que o tigre ficou maluco. O tigre não ficou maluco. O tigre ficou tigre.”
A Onça Pintada (Panthera Onca) que corria em circulos, parando de quando em quando para se esticar nas grades é algo que fez até mesmo as crianças que jogavam pedras em outros animais pensar sobre. “Mamãe, por que não colocam ela numa jaula maior?” Excelente pergunta.
O Urso Pardo (Ursus Arctos), na natureza um animal poderoso, caçador e territorialista extremo, no zoológico um animal que passa o dia todo com a barriga para cima, de vez em quando caçando as folhas que caem das árvores, de vez em quando tentando morder o próprio pé. O Tigre Siberiano (Panthera Tigris Altaica), maior felino vivo hoje em dia, pode chegar a pesar 300kg e medir mais de três metros do focinho até a ponta da cauda. No zoológico apenas um gatinho que dorme o dia todo e durante a noite fica olhando para o nada.
Não acho estranho que normalmente os animais que vivem soltos na natureza pesem muito menos que seus companheiros enjaulados, já que eles tem todo o tempo do mundo correr atrás de suas presas ou brincar com outros membros de sua espécie e os animais do zoológico pesem muito mais já que ficam entediados o dia todo, apenas treinando sua paciência com pessoas que cada vez mais exageram na forma de chamar sua atenção. Tive o azar de ouvir da boca de um pai de família a seguinte frase, “Levanta, bicho burro! Vai ficar deitado aí? Paguei R$ 6,00 pra te ver. Levanta.” Preciso comentar?
Mas nem todo o dia foi uma experiência que me trouxe remorso e pesar na minha visita ao zoológico. Acho que não houve momento mais emocionante do que sentir a proximidade de um animal que tem pelo menos quatro vezes o meu tamanho e não entenderia como problema me pisotear vivo.
Pisotear? Não. O simpático e desengonçado Girafa (Giraffa Camelopardalis) chamada “Zagalo”, um macho que mede mais de 5m de altura não faria isso. Se fosse um animal agressivo teria cortado minha mão fora quando me aproximei demais e dei algumas folhagens para ele comer. Segundos depois estava fazendo carinho em sua cabeça. A respiração daquele animal é absurdamente forte e seu pêlo um pouco mais duro do que eu imaginava. Naquele momento tive a consciência de que estava burlando duas leis do local: alimentar animais e atravessar a grade de segurança (Hey, eu também cometi um erro, certo?)
Mas é óbvio que como todo fotógrafo estou geralmente atrás da câmera e seria uma atitute idiota pedir para um segurança ou visitante tirar uma foto minha fazendo algo que naquele zoológico é proibido. Mas valeu a pena. Óbvio que não se repetirá, mas da próxima vez que eu encostar em uma Girafa, será na África.
Sobre a foto da Arara-Azul ou Araraúna (Anodorhynchus Hyacinthinus), gostaria de informar que o fotógrafo Luis Cláudio Marigo, profundo conhecedor da fauna e flora brasileira, fez um trabalho hercúleo ao fotografar esse animal em seu habitat natural dito que ele faz parte da Lista Vermelha de animais com risco de extinção. A única diferença entre a minha foto e as dele é que na minha grades me separavam do animal.
Enquanto caminhava pelos pátios do zoológico e fotografava sem parar todos os animais que encontrava pela frente, sem deixar de sentir calafrios ao escutar o potente rugido do Leão ao longe e o grasnar dos Urubus e Garças que por ali voavam encontrei personagens que me fizeram refletir muito sobre o que se vê em um lugar como aquele.
Como por exemplo o turista argentino que exclamou, “En San Pablo eles son mejores tratados”, ou o segurança, apaixonado pelos animais, que certa vez teve que salvar uma criança que caiu dentro da cerca do elefante. Foi quando perguntei, “Mas por que eu ainda acho que esses animais mereciam estar soltos?”, e recebi a seguinte resposta, “É uma questão de ponto de vista. Aqui dentro eles são bem tratatos e morrem de velhice. Lá fora eles são assassinados e viram troféus.”
Acho que foi isso que aquele cara quis dizer com ‘detentos’.

Obs: O sujeito fazendo carinho na Girafa não sou eu. Ele é o tratador do zoológico que chamei para retirar um pedaço da grade que havia machucado o animal.

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